terça-feira, agosto 16, 2016

Novas Políticas Comportamentais: O Modelo ADN

Nota: este post é baseado num artigo que escrevi com o Diogo Gonçalves para a revista Psicologia na Actualidade (agora: Psychology Now). Reproduzo e sumarizo aqui a ideia geral do artigo, com permissão do Diogo.

Durante décadas, decisores políticos utilizaram as ferramentas oferecidas pela microeconomia para desenhar e implementar políticas públicas. Embora muitas destas políticas tenham, inicialmente, sido bem sucedidas, à medida que os desafios encontrados pelos políticos aumenta em complexidade, a "caixa de ferramentas" standard da microeconomia tem-se demonstrado incapaz de lidar, de forma eficiente, com problemas graves como a corrupção, criminalidade, saúde pública, poupança, etc.

Num artigo de opinião publicado recentemente com o Diogo Gonçalves, tentamos convencer decisores responsáveis por políticas públicas (que inclui políticos na administração central, local, instituições públicas, responsáveis pela saúde pública, etc) de que podem desenhar políticas mais eficazes, eficientes e menos dispendiosas fazendo um uso mais intensivo de ciências comportamentais. Isto é, indo além da microeconomia (standard) e incorporando, nas intervenções públicas, conhecimento criado nas áreas da psicologia e economia comportamental, podemos conseguir mais e melhores políticas.

No artigo tentamos explicar as razões por detrás do sucesso desta nova geração de "políticas comportamentais". A ideia chave é a de que estas políticas - que são desenhadas tendo em conta regularidades empíricas descobertas e documentadas por cientistas comportamentais - são particularmente eficazes ao lidarem, precisamente, com aqueles problemas que são mais difícieis de resolver: problemas criados ou reforçados por hábitos e comportamentos que estão enraizados nos nossos cérebros. Este tipo de problemas inclui, por exemplo, lutar contra a obesidade, corrupção, evasão fiscal, aumentar os níveis de poupança, aumentar a sensibilidade para questões ambientais, promover o empreendedorism, etc. Tais problemas são muito difíceis de combater utilizando modelos e incentivos "racionais" por um simples fato: Na sua génese estão, muitas vezes, decisões pouco ou nada racionais. A melhor forma de mudar este tipo de comportamentos é, desta forma, intervir de forma a colocar os instintos humanos a jogarem em nosso favor, em vez de contra o nosso próprio interesse.

O Modelo DNA: Como Podem os Decisores Políticos Utilizar Este Conhecimento para Desenhar e Implementar Políticas mais Inteligentes?

No artigo discutimos em detalhe um modelo que propomos para ajudar decisores a desenhar e implementar melhores políticas comportamentais. Trata-se de um modelo com três passos chave:

(1) Audiência: Identificar e seleccionar a audiência alvo da política a ser implementada. É importante notar que, por "audiência" nos referimos não só ao segmento alvo da população mas, também, ao contexto específico sobre o qual irá incidir determinada política ou intervenção.

(2) Determinantes Comportamentais: Examinar e estudar os determinantes comportamentais que caracterizam a audiência alvo e o problema a atacar.

(3) Novas Políticas Comportamentais: Utilizar o conhecimento e informação recolhida no passo 2 para desenhar e implementar uma política comportamental capaz de utilizar os determinantes comportamentais - tanto cognitivos como afetivos - identificados para desenvolver uma polítia capaz de gerar comportamentos desejáveis ou evitar indesejáveis.

O Modelo DNA em Prática: As Lotarias Fiscais em Portugal

Em 2013-2014, Portugal - na altura sob medidas de austeridade rigorosas impostas pela Troika (FMI, Comissão Europeia e BCE) para estabilizar as finanças públicas do país - nessitava de assegurar que a sua cobrança de impostos melhorava. Era urgente diminur rapidamenet a evasão fiscal. Como resposta, o Governo Português da altura lançou um esquema de "loterias fiscais" que foi muito bem sucedido. Podemos facilmente analisar esta decisão política regime em termos do nosso modelo ABC:

  • Audiência: O governo Português escolheu, como alvo da sua intervenção, o cidadão médio Português nas suas transações mundanas. A meta do governo era mobilizar os cidadãos comuns para ajudar a combater a evasão fiscal, motivando-os a pedir recibos sempre que eles fazem uma transação económica, por mais pequena que seja. Por exemplo, o governo queria incentivar o cidadão a pedir recibo ou fatura quando consome em restaurantes, cafés, cabeleireiro, manutenção do carro, etc, fomentando a cobrança de impostos sobre esses valores.

  • Determinantes Comportamentais: Em termos de perspectivas comportamentais, o governo parece ter usado o fato - bem estabelecido na literatura de economia comportamental e psicologia - de que as pessoas tendem a colocar um excesso de peso em pequenas probabilidades (ver, por exemplo Kahneman e Tversky (1979), Prospect Theory). Este simples fato permitiu ao governo conceber uma política (a "loteria tax") que usa uma quantidade de dinheiro atuarialmente equivalente ao que poderia ser usado num sistema de incentivos fixo (por exemplo, uma quantia fixa de dinheiro), mas que é desproporcionalmente mais eficaz. Mais, a literatura demonstra que a magnitude deste excesso de peso em probabilidades pequenas é particularmente forte quando o benefício potencial é emocionalmente apelativo [fonte], algo que serviu de suporte à escolha de incentivo utilizada pelo governo (ver próximo ponto).

  • Novas Políticas Comportamentais: Por fim, armado com este conhecimento, o Governo Português tornou-se, em 2014, um dos primeiros Estados-Membros da UE (juntamente com Malta e Eslováquia) a usar "loterias fiscais" através do qual os cidadãos que realizassem o seu dever cívico de pedir recibos quando compram bens ou serviços, poderiam ganhar um carro de luxo (um bem emocionalmente apelativo, para inflacionar ainda mais a eficácia da medida).

    A medida for considerada um sucesso. As lotarias fiscais geraram, no primeiro mês da sua implementação, um aumento de 45% na procura de recibos relacionados com a compra de bens ou serviços. Durante 2014, houve um aumento agregado de 36,3% na procura de recibos que permitam a participação na lotaria, e estima-se que a medida tenha originado um aumento total de 45% em termos de imposto de renda, correspondente a EUR 750M [fonte].

    Em suma, tanto o Diogo como eu estamos convencidos de que este tipo de novas e mais eficazes políticas comportamentais irá florescer nos próximos anos. Esperamos que nosso artigo ajude e esta explosão e convença os decisores políticos em Portugal, e não só, a investirem ainda mais - e de forma confiante - nesta nova e muito eficaz "caixa de ferramentas" que está à sua disposição.

  • domingo, setembro 22, 2013

    Conferência: "Applying behavioural insights to policy-making", Bruxelas, 30 de Setembro, 2013

    A Comissão Europeia organiza, na próxima Segunda-Feira, em Bruxelas, a conferência "APPLYING BEHAVIOURAL INSIGHTS TO POLICY-MAKING: RESULTS,PROMISES AND LIMITATIONS". Nesta conferência, um painel de luxo composto de economistas comportamentais, académicos e polítcos que irão discutir a seguinte questão: Como pode a Economia Comportamental ser utilizada para influenciar a política pública da Comissão Europeia, por forma a beneficiar os consumidores e os cidadãos europeus?.

    Parece-me um excelente programa que, entre tantos outros, conta com a participação do Prof. Eldar Shafir bem como de Neven Mimica (Comissário Europeu para os Consumidores) e Paola Testori Coggi (Directora Geral no DG para Saúde e Consumidores da Comissão EuropeiaHealth and Consumers of the European Commission). Mesmo para quem não se pode deslocar a Bruxelas, vale a pena dar uma vista de olhos nos tópicos em discussão e na bibliografia recomendada. Link: http://ec.europa.eu/dgs/health_consumer/information_sources/consumer_affairs_events_en.htm

    terça-feira, março 17, 2009

    Menos escrita neste blog, mais no c.mkt

    A partir de agora a maioria dos meus posts será colocada no blog c.mkt - novas fronteiras no marketing.

    Apesar de ser, em primeiro lugar, dedicado ao marketing, o c.mkt continuará a ser um espaço aberto à discussão de tópicos relacionados com Economia Comportamental.

    Neste blog passarei a disponibilizar links e vídeos mas sem adicionar grandes discussões:

    Daniel Kahnemann e Nassim Taleb reflectem sobre a crise
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    sábado, novembro 29, 2008

    Pessimismo

    De facto, o pessimismo de muitos nós, se não for exagerado, pode ajudar a evitar situações desagradáveis como a actual crise financeira que se acentuou devido a expectativas demasiado optimistas de muitos, sobretudo nos EUA (ver aqui um artigo de opinião sobre o tema de Barbara Ehrenreich no NY Times, de 23 Setembro de 2008).

    quinta-feira, outubro 23, 2008

    Memória Colectiva

    Excerto do filme "Walking life"... não necessariamente uma reflexão de Economia Comportamental, mas apenas acerca de comportamento humano em geral... Serão os nossos instintos produto da nossa evolução?

    sábado, outubro 11, 2008

    Como tomar melhores decisões (BBC)?

    E já agora, deixo aqui um link para um programa muito interessante da BBC acerca de como tomar melhores decisões:

    Pânico, Medo e Comportamento de Grupo - A Psicologia da Crise de Crédito

    Contabilidade Mental II - Agora com Gene Hackman e Dustin Hoffman

    Aqui há uns tempos escrevi, neste post no blog cienciamkt, acerca da teoria da Contabilidade Mental (Mental Accounting) de Richard Thaler.

    Agora deixo aqui um vídeo em que Gene Hackman explica, de forma intuitiva, o que significa a Mental Accounting nas decisões de consumo/poupança em pessoas reais como... Dustin Hoffman. ;)

    NC.

    quarta-feira, agosto 06, 2008

    Expectativas influenciam as nossas atitudes e percepções!

    No vídeo abaixo o Prof. Dan Ariely revê investigação fascinante que demonstrou que as nossas expectativas, que podem ser conduzidas por factores como o preço ou a publicidade, influenciam as nossas atitudes, percepções e comportamentos...

    Ao darem comprimidos "placebo" (isto é que não tinham qualquer efeito farmacológico) contra as dores a dois grupos de participantes, aqueles que tinham recebido a informação de que este era um medicamento caro (vs. barato) sentiram-se bastante melhor após tomarem o medicamento:



    Este mesmo efeito já tinha sido demonstrado por Shiv, Carmon e Ariely num artigo no Journal of Marketing Research em 2005. Neste caso os investigadores utilizaram uma bebida que promete estimular a mente - Sobe Adrenaline Rush. Os alunos que participaram na experiência tiveram de pagar por uma lata de Sobe e consumi-la no início da experiência. Metade deles pagou $1.89, outra metade $0.89. Depois tiveram de resolver puzzles e anagramas. Em várias repetições desta experiência, o grupo que mais pagou pela bebida foi capaz de resolver significativamente mais anagramas num espaço de 30 minutos do que o grupo que tinha pago $0.89... curioso, não é?

    terça-feira, julho 29, 2008

    Obama-mania na Europa



    E já agora uma análise do Economista Comportamental, e autor do livro Predictably Irrational, Dan Ariely sobre a oferta, feita há uns meses atrás por Hillary a Obama para este se tornar seu vice-presidente... Hillary...ante!

    domingo, julho 13, 2008

    Predictably Irrational - O Blog

    Além do sucesso do seu livro - Predictably Irrational - o blog do Prof. Dan Ariely, Professor de Behavioral Economics no M.I.T., figura já entre os mais influentes blogs do mundo na área de Economia. Por exemplo, figura em 26º lugar neste ranking de blogs de Economia. Não sei como é calculado nem qual a validade deste ranking. Sei que conheço e frequento alguns destes blogs (por exemplo o de Greg Mankiw, o Overcoming Bias e o Becker-Posner) e gosto bastante de todos... O Predictably Irrational, no entanto, é neste momento um dos meus favoritos....

    NC

    domingo, julho 06, 2008

    Aversão à Incerteza

    Não foi há muito tempo que a revista Exame lançou a Edição Especial 2008 "Portugal em Exame - Caminhos para Portugal". Nesta edição ilustres personalidades do panorama económico, científico e político português pronunciaram-se sobre as estratégias que o país pode e deve seguir para se tornar mais competitivo e melhorar o seu desempenho. Dois factores foram sublinhados por grande parte dos intervenientes: (1) o excesso de peso do Estado em Portugal e (2) um certo conservadorismo e aversão ao risco que caracterizam a população em geral e que têm contribuído para uma certa falta de dinâmica que seria desejável na economia nacional. Passo a transcrever três citações que ilustram este sentimento:

    "O problema está na política económica que reforça o 'status quo'"
    António Borges, professor na Universidade Católica

    "Há uma certa aversão ao risco. Devíamos ter um espírito mais empreendedor"
    António Horta Osório, CEO da Abbey International e Presidente do C.A. do Santander Totta

    "Portugal tem o desafio de terminar com os preconceitos e paradigmas que limitam a criatividade e o arrojo"Filipe Vila Nova, presidente da Irmãos Vila Nova

    Parece de facto faltar algum arrojo para, nomeadamente, abrir negócios ou fazê-los crescer numa perspectiva global. Em boa verdade, na minha humilde opinião, sinto que falta também algum carinho e respeito, por parte da sociedade, pela profissão do empresário.

    Joseph Alois Schumpeter (1883-1950), um dos grandes Economistas de todos os tempos, defendia que o empresário é a figura central num sistema económico moderno (e capitalista). É ele o responsável máximo pela prosperidade, ao criar concorrência, perturbar o status quo, gerar inovação, renovação do tecido empresarial e, desta forma, garantir o crescimento e a vitalidade da Economia...

    A Disnatia de Aviz e a Escola de Sagres - Geração Arrojada

    Foi este espírito empreendedor que caracterizou a fabulosa dinastia de Aviz e levou D. João I e o Infante D. Henrique a tornarem Portugal num verdadeiro pioneiro da globalização.

    Hoje em dia ainda existem certamente muitos Infantes D. Henrique no nosso país. No entanto, parece que os "velhos do restelo" têm elevado a sua voz de forma mais convincente do que no passado... conseguindo conter a garra e ímpeto destes novos descobridores (levando alguns a, infelizmente, navegarem para outros reinos). Apesar de não ter ganho o concurso "maior português de todos os tempos", assim merecia, na minha opinião, o Infante D. Henrique ou o seu pai... Ele foi capaz de criar uma dinâmica de arrojo em torno da mítica e lendária Escola de Sagres, igonorando (felizmente) as vozes da reacção...



    Mas um velho d'aspeito venerando,
    Que ficava nas praias, entre a gente,
    Postos em nós os olhos, meneando
    Três vezes a cabeça, descontente,
    A voz pesada um pouco alevantando,
    Que nós no mar ouvimos claramente,
    C'um saber só de experiências feito,
    Tais palavras tirou do experto peito:

    - "Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
    Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
    Ó fraudulento gosto, que se atiça
    C'uma aura popular, que honra se chama!
    Que castigo tamanho e que justiça
    Fazes no peito vão que muito te ama!
    Que mortes, que perigos, que tormentas,
    Que crueldades neles experimentas!


    Os Lusíadas, Canto IV, 94-95 (sobre o Velho do Restelo)

    Risco ou Incerteza?

    No entanto o grande problema de Portugal não me paree ser a aversão ao risco mas, antes, uma aversão exagerada a situações incertas. A diferença parece teórica, admito. No entanto penso ser importante esta distinção para percebemos como tomamos as nossas decisões e o que pode ser feito para, por exemplo, fomentar o empreendedorismo.

    Enquanto risco é quantificável (por exemplo tenho uma hipótese em 6,000,000 de ganhar o totoloto) a incerteza é inerentemente difusa - é um sentimento de ambiguidade, uma incapacidade de quantificar os riscos associados com determinada decisão. É desta ambiguidade que os Portugueses fogem e não tanto do risco, senão vejamos.

    Portugal é o segundo país mais avesso à incerteza...

    Geert Hofstede é um influente sociólogo Holandês que, nos anos 70 e 80 inquiriu colaboradores da empresa IBM em 53 países diferentes e classificou as diferenças culturais entre os países de acordo com 4 dimensões:

    - distância ao poder - até que ponto os cidadãos aceitam uma distribuição desigual do poder e hierarquias claras
    - individualismo/colectivismo - até que ponto os cidadãos estabelecem laços fortes ou fracos entre si (isto é qual o papel de grupos sociais, da família...)
    - masculinidade - até que ponto o papel de ambos os sexos é distinto e os valores masculinos (carreira, dinheiro) prevalecem sobre valores tradicionalmente mais femininos (objectivos sociais, valor dado aos relacionamentos,...)
    - medo da incerteza - até que ponto os cidadãos se sentem ameaçados pelo desconhecido

    Mais tarde a amostra foi extendida para 70 países, ínumeros estudos de replicação foram feitos desde então e uma quinta dimensão cultural - orientação para o longo vs. curto prazo - foi adicionada.

    Em todas estas dimensões Portugal destaca-se pela sua pontuação em termos de aversão à incerteza. Com uma pontuação de 104, Portugal é o segundo país da amostra com maior aversão à incerteza (o primeiro é a Grécia, o terceiro a Guatemala) [ver ranking aqui].

    No entanto, infelizmente, isto não significa que os Portugueses não gostam de arriscar. Pensemos nos hábitos de condução. Pensemos nas apostas feitas em lotarias e totolotos. Aparentemente fugimos frequentemente do incerto mas não do improvável.

    Por exemplo, retirei este excerto do Expresso das Nove, um jornal Açoriano, que demonstra bem como até arriscamos se calhar em demasia:



    "a nível europeu, Portugal lidera, a par da França, o ranking de vendas semanais, assumindo um lugar de destaque perante os outros países que participam no jogo(...)" (ver notícia aqui).

    O "jogo" referido na notícia é o Euromilhões, cuja probabilidade de ganhar é, como todos sabemos, muito baixa. Vale a pena recordar ainda que com 10 milhões de habitantes, Portugal tem uma população quase 6.5 vezes inferior à da França!

    Importa, então, perceber qual a verdadeira origem de um comportamento padrão tão avesso à incerteza e tentar mudá-lo no sentido de corrermos os riscos certos, aqueles que contribuirão para uma maior prosperidade.

    O que fazer?

    Segundo Hofstede, pessoas provenientes de uma cultura com muita aversão à incerteza tenderão a procurar estrutra nas organizações, instituições e relações de modo a tornar os acontecimentos mais fáceis de interpretar e prever (podemos por exemplo prever que os Portugueses, quando comparados com cidadãos de países menos avessos à incerteza, tenderão a preferir um emprego estável numa empresa segura em vez de situações mais imprevisíveis - ainda que com promessas de maiores ganhos).

    Um dos paradoxos referidos por Hofstede no seu livro "Culture Consequences" parece poder explicar a dicotomia euromilhões-empreendedorismo. Segundo o célebre sociólogo Holandês, se a aversão à incerteza for muito elevada, os cidadãos podem (paradoxalmente) decidir correr riscos exagerados para evitarem essa mesma a incerteza. Ele dá o exemplo da decisão de começar uma luta com um potencial inimigo (arriscando) para acabar com a incerteza do que irá acontecer se esperar...).

    Desta forma, a solução para fomentar empreendedorismo em Portugal poderá, por exemplo, passar por transformar a "incerteza" de um novo negócio em risco através de divulgação de taxas de sucesso por sector ou outra informação deste género. Pode também passar por tentar incutir desde cedo nas crianças e jovens estudantes a noção de que em todas as actividades há sempre a necessidade de pesar risco e benefício e que a incerteza é algo inerente a muitos dos desafios do mundo moderno.

    Como atrair de volta talentos nacionais?

    Por fim, existe hoje uma nova geração de Portugueses que, à semelhança do que já tinha acontecido no passado, enfrentam a incerteza do desconhecido ao decidirem estudar, investigar ou trabalhar noutros países. A garra destes Portugueses não é novidade. O Luxemburgo, por exemplo, com uma percentagem muito grande da população activa com origem Lusitana é um dos países mais produtivos do mundo. A nova geração de emigrantes Portugueses tem a garra das gerações anteriores associada a uma nivel de qualificação médio mais elevado, uma fórmula de sucesso. De facto, muitos destes novos expatriados são verdadeiros talentos nas suas áreas profissionais. E uma parte destes estão disponíveis e interessados em regressar a Portugal mais cedo ou mais tarde - ver por exemplo os resultados de um inquérito feito pela Jason Associates ao "talento expatriado nacional" [aqui].

    É preciso saber aproveitar o capital humano que representa esta geração de jovens que não se conformou com o desemprego, com salários baixos e procurou novas oportunidades... O desafio é demonstrar-lhes que podem continuar a batalhar pelos seus sonhos em Portugal, que o país os acolhe de braços abertos (e não com inveja e desconfiança) e lhes oferece condições para regressarem a casa e, a partir de uma nova Sagres, colocarem Portugal de novo numa dinâmica de progresso e prosperidade!

    terça-feira, maio 06, 2008

    Mercados de Previsão



    Neste vídeo da BusinessWeek, a Profª Joyce Berg, directora do mercado de previsão Iowa Electronic Markets explica-nos as vantagens destes mecanismos de previsão. Desde 1988 que o Iowa Electronics Markets negoceia candidatos políticos. Podemos comprar acções para o candidato Barack Obama ou Hillary Clinton. Para as eleições americanas deste ano já foram comprados 1,000,000 de contratos.

    Estes mercados são óptimos para estudar como funcionam mercados financeiros mas, além disso, são excelentes métodos para fazer previsões. A teoria dos mercados de previsão prova que o preço destas "acções" é um reflexo da crença dos investidores no evento em que apostam e, portanto, o facto de hoje Barack Obama estar cotado a $0.775 significa, na opninião destes investidores, Obama tem uma probabilidade de cerca de 78% de ser o nomeado pelo Partido Democrata para concorrer a presidented dos EUA. O preço de Hillary Clinton estava, ontem, nos $0.22. Parece que não está fácil ser este o ano da primeira mulher presidente dos EUA.
    Quanto à luta Democratas versus republicanos, o Preço dos Democratas está nos $0.528 e o dos Republicanos nos $0.499, o que sugere que Obama arrisca-se mesmo a ser eleito presidente.

    Do lado Republicano é quase certo que será John McCain o candidato nomeado, a sua cotação é hoje de $0.925. Isto significa ainda que, apesar de Barack Obama ter razões para estar feliz, até que Hillary desista ou o Partido Democrata nomeie finalmente um deles (segundo o mercado será Obama), quem tem maior probabilidade incondicional de ser presidente dos EUA é ainda John McCain. Senão basta ver que:

    Pr(McCain ser Presidente) = Pr(McCain ser Nomeado)*Pr(Ser Eleito|Nomeação)=0.499*0.925=0.461575
    Pr(Obama ser Presidente) = Pr(Obama ser Nomeado)*Pr(Ser Eleito|Nomeação)=0.528*0.775=0.4092

    Será que devemos confiar em pessoas "comuns" que apenas "jogam" comprando e vendendo acções sem responderem a nenhuma pergunta acerca da sua intenção de voto? Comparados com outros modelos de previsão, os mercados de previsão têm feito um excelente trabalho demonstrando performances tão boas ou melhores que métodos convencionais como inquéritos e sondagens. O poder destes mercados de previsão parece residir na "sabedoria de grupo", uma teoria popularizada pelo jornalista James Surowiecki, uma teoria que defende que a "sabedoria" de um grupo é superior à de qualquer dos seus membros, mesmo os mais informados.

    Alguns elementos, no entanto, contribuem para melhores previsões. Cada um dos "investidores" deve ter acesso a alguma informação privada, ainda que seja apenas uma opinião. Ou seja, as opiniões devem, até certo ponto ser independents e descentralizadas em vez de serem muito polarizadas em conhecimentos locais, muito homogéneas ou influenciadas pelos outros investidores. Ou seja, também nos mercados de previsão há regras acerca da eficiência dos mercados que devem ser cumpridas... Mais uma oportunidade para estudar o comportamento do investidor, neste caso, do previsor! :)

    Outro vídeo que explica o conceito de forma muito intuitiva:

    sexta-feira, abril 04, 2008

    Contabilidade Mental

    Em honra a Richard Thaler e ao facto do seu artigo de 1985 no jornal marketing science ter sido revisitado como um dos clássicos da revista na sua última edição (Março de 2008) escrevi um novo
    post no meu outro blog, o cienciamkt.

    Nesta última edição o editor da Marketing Science pediu a Richard Thaler que comentasse o artigo. No seu comentário o Prof. Thaler explica porque razão ficou surpreendido e desapontado pelo facto da Economia Comportamental, extremamente popular entre departamentos académicos de Finanças e Economia, parece estar a ter mais dificuldade em convencer a comunidade do Marketing Científico.

    NC