segunda-feira, janeiro 14, 2008

Schadenfreude - Preferências Conjuntas

A análise do comportamento dos agentes económicos inseridos em sociedade tem sido objecto de um cada vez maior número de estudos. A ideia do agente egoísta que age apenas tendo em conta o seu próprio interesse tem sido posta em causa por ínumeros economistas de renome. O prémio nobel da Economia Gary Becker (1992), por exemplo, escreveu em conjunto com Kevin Murphy (também Prof. de Economia na Univ. Chicago e vencedor da John Bates Clark Medal em 1997) um interessante livro entitulado Social Economics Market Behavior in a Social Environment em que propõe uma metodologia de análise microeconómica que utiliza funções utilidade que admitem a influência do contexto social e das preferências alheias no comportamento dos agentes. Por outras palavras, estes autores propõe uma forma de captar, através de modelos económicos, situações em que o comportamento e as preferências de outros influenciam as nossas decisões.

Comportamentos altruístas ou utilidade retirada das desilusões dos outros passam, assim, a ser elegantemente reconciliados com a teoria microeconómica. Sem estas preocupações tais motivações seriam difíceis de conciliar com os pressupostos de racionalidade inerentes à teoria económica mais ortodoxa. Um desses comportamentos é a tendência a que alguns psicólogos chamam de Schadenfreude, uma palavra de origem alemã que significa "retirar prazer dos azares e falhas dos outros". O conceito budista de mudita, que significa "retirar prazer da fortuna dos outros" é muitas vezes considerado um antónimo de Schadenfreude (ver por exemplo neste artigo na Wikipedia).



A consideração da interacção entre as preferências de diversas pessoas permite aos economistas desenvolverem modelos que captem padrões comportamentais que, de outra forma, poderia ser considerados irracionais. Porque decidem começar a fumar os adolescentes sabendo que é prejudicial à saúde? Como se estabelecem e espalham padrões no uso de drogas e consumo excessivo de álcool? Como e porque se desenvolvem ghettos? Como se desenrolam, explodem e morrem modas e processos sujeitos ao fenómeno de tipping point?

Perceber estas interacções é, desta forma, crucial não só para entendermos comportamentos aparentemente desviantes (pelo menos de acordo com os postulados clássicos de racionalidade) mas, também, para podermos perceber e tentar gerir fenómenos de contágio de informação e marketing viral, cada vez mais cobiçados por empresas de diversos sectores e cada vez mais necessários ao sucesso de ínumeros produtos e serviços.

O próprio Adam Smith, mais conhecido pela visão egoísta do ser humano veiculada no famoso livro A Riqueza das Nações (1776) , salientava em 1759, noutro livro que, na sua época, foi bastante influente - Teoria dos Sentimentos Morais - que faz parte da natureza humana ser influenciado pela fortuna dos outros. Ínumeros economistas e psicólogos sublinham ainda o poder das comparações e da posição relativa que cada um desempenha na sociedade na determinação da nossa própria felicidade e comportamentos, em oposição à ideia de que a riqueza pessoal é um indicador absoluto de bem-estar.

Deixo aqui uma passagem com que Adam Smith abriu o seu livro Teoria dos Sentimentos Morais:

"How selfish soever man may be supposed, there are evidently some principles in his nature, which interest him in the fortune of others, and render their happiness necessary to him, though he derives nothing from it except the pleasure of seeing it."

Adam Smith em "A Teoria dos Sentimentos Morais" (1759)