sexta-feira, agosto 11, 2006

Piada Americana

"Um homem viajando, de avião, sobre os Estados Unidos decide falar com o passageiro do lado, para quebrar o gelo:

- Está a ver aquelas montanhas ali em baixo? - pergunta com ar sábio - Têm 1 milhão e 4 anos de idade.

Intrigado, o vizinho pergunta-lhe como pode ele estar tão seguro da idade precisa de tais montanhas. Orgulhoso, o homem responde:

- Já não é a primeira vez que faço esta viagem! Há quatro anos, quando passava neste mesmo sítio, estava um indíviduo sentado ao meu lado, cujo passatempo favorito era a geologia, que me disse que as montanhas tinham um milhão de anos. É só fazer as contas. Hoje têm um milhão e quatro!!"


Source: Thanks to the photographer for sharing this photo here!

Aparentemente desligada desta piada está uma característica, ou um atalho de raciocínio (heuristic), típica do ser humano: ao fazermos avaliações, escolhas ou tomarmos decisões, temos a tendência de nos fixar numa âncora e ajustar (insuficientemente) as nossas previsões a partir desse ponto. Este fenómeno viola princípios basilares do conceito tradicional de utilidade. A teoria clássica assume que as preferências são independentes de pontos de referência, invariantes a variações superficiais na maneira como são apresentadas os problemas/escolhas e medidas as preferências.

Um estudo de 1974 da autoria de Amos Tversky e Daniel Kahneman (citado, de acordo com scholar.google.com por mais de 2800 outros investigadores), publicado na revista Science sob o título "Judgment under Uncertainty: Heuristics and Biases", testou esta hipótese pedindo aos participantes para julgarem a percentagem de países africanos nas Nações Unidas. No entanto, antes de recolher as respostas, os participantes viam uma "roda da fortuna" com números de 0 a 100 girar e, após parar num número aleatório respondiam se a percentagem de países era acima ou abaixo daquele número. Depois davam os seus palpites.

Os palpites, como demonstrado pelos autores, tinham tendência a ser muito influenciados pelo número que tinham visto na roda, apesar de ser aleatório. Diversos estudos replicaram estes resultados, por exemplo no contexto de escolhas - ver por exemplo o artigo "Coherent Arbitrariness: Stable Demand Curves Without Stable Preferences", de Dan Ariely, George Loewenstein e Drazen Prelec (Quarterly Journal of Economics, 2003).

No entanto, em pesquisas mais recentes, investigadores têm encontrado provas de que, apesar de reveleram preferências inconsistentes e dependentes do contexto (por exemplo - influenciadas por uma âncora), os humanos obedecem a princípios normativos (como os defendidos pela teoria clássica) quando tal é transparente. É isto que Ariely, Loewenstein e Prelec chamam de "Coherent Arbitrariness". Foi o que fez o passageiro na piada americana... ajustou, de acordo com as regras da aritmética, a âncora recebida 4 anos antes por parte de um "amante de geologia".

Referência

Este post foi baseado numa discussão presente no primeiro capítulo de "Advances in Behavioral Economics" de Colin F. Camerer, George Loewenstein e Matthew Rabin.

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