terça-feira, dezembro 11, 2007

Usando economia comportamental para promover comportamentos saudáveis

Na edição de 28 de Novembro do JAMA (The Journal of the American Medical Association) George Loewenstein, em conjunto com Troyen Brennan e Kevin Volpp, dois investigadores em Medicina, publicaram um breve artigo em como aplicar conceitos de economia comportamental para promover comportamentos saudáveis em pacientes e na população em geral.

Um dos exemplos clássicos discutidos é o efeito da opção por defeito nas escolhas que as pessoas fazem. Todos temos noção da influência da opção standard nas nossas escolhas. Por exemplo, em Portugal a legislação acerca de doação de orgãos assenta no conceito de doação presumida, isto é, os cidadãos que não quiserem que os seus orgãos sejam eventualmente doados em caso de morte têm de se deslocar a qualuqer centro de saúde e, apresentando o seu BI, declarar que pretendem inscrever-se no Registo Nacional de Não Dadores.

Num artigo de 2003 na revista norte-americana Science, os psicólogos Daniel Goldstein e Eric Johnson mostraram que o facto de a legislação de um país presumir, por defeito, doação ou não doação de orgãos altera de forma dramática as escolhas dos cidadãos em relação a esta importante decisão. O gráfico seguinte, que inclui as taxas de doação calculadas pelos autores numa série de países europeus (Portugal está representado apenas com a letra 'P', 'PO' refere-se à Polónia), ilustra de forma clara este fenómeno:



Fonte: Daniel Goldstein e Eric Johnson (2003), "Do Defaults Save Lives?," Science, 302, pp. 1338-1339


Os autores realizaram ainda uma série de experiências em que demonstram que este é um padrão comportamental robusto. Esta tendência foi etiquetada no final dos anos 1980, num artigo clássico de William Samuelson e Richard Zeckhauser, como a Status Quo Bias. O artigo, um dos primeiros do Journal of Risk and Uncertainty, começava com a seguinte citação de Samuel Johnson:

"To do nothing is within the power of all men."


No artigo do mês passado no JAMA os autores revisitam este padrão comportamental que tanto se aplica à decisão de doar, ou não, orgãos como à decisão de ficar com uma caneca-brinde ou com um equivalente monetário, como demonstrado numas famosas experiências realizadas por Daniel Kahneman, Jack Knetsch e Richard Thaler no início dos anos 90 (ver o artigo "The Endowment Effect, Loss Aversion, and Status Quo Bias: Anomalies"). Na área médica os autores referem que, por exemplo, marcar automaticamente (e por antecipação) testes ou outras tarefas de medicina preventiva iria certamente aumentar este tipo de comportamento desejável na população. Outros exemplos incluem mudar a opção para a bebida de acompanhamento de uma refição, por defeito, para água. Colocar alimentos menos saudáveis, por exemplo numa cantina, numa segunda linha de acesso menos fácil (obrigando à decisão explícita de os preferir em vez de algo mais saudável), ou mesmo pedindo às pessoas que se escolham com alguma antecedência que tipo de alimentos ou bebida vão preferir no dia seguinte ou nas horas seguintes (jogando com outra anomalia comportamental que reflecte a tensão entre preferências de curto e longo prazo, muitas vezes ligada às teorias de desconto hiperbólico do tempo, entre outras explicações).

Não estranhe, portanto, quando ouvir alguém na mesa ao lado da sua, num restaurante, pedir o costume ou a intensidade com que empresas como Google, Yahoo e Microsoft lutam por ter os seus motores de busca e portais associados, por defeito, aos nossos browsers...


Algumas referências úteis:
  • Johnson and Goldstein (2003), "Do Defaults Save Lives?," Science, 302, pp. 1338-1339
  • Kahneman, Knetsch e Thaler (1991), "The Endowment Effect, Loss Aversion, and Status Quo Bias: Anomalies," The Journal of Economic Perspectives, 5 (1), pp. 193-206
  • Loewenstein, Brennan e Volpp (2007), "Asymmetric Paternalism to Improve Health Behaviors," JAMA, 298 (20), pp. 2415-2417
  • Samuelson e Zeckhauser (1988), "Status Quo Bias in Decision Making," Journal of Risk and Uncertainty, 1 (1), pp. 7-59, Março
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